André Mendonça derruba prefeito e vice de Cametá e mantém nova eleição

O ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), André Mendonça, proferiu na sexta-feira (19) decisão que muda de forma definitiva o cenário político de Cametá, no Baixo Tocantins. Ele negou seguimento aos agravos interpostos pelo prefeito Victor Corrêa Cassiano e seu vice, Ênio de Carvalho, revogando a liminar que os mantinha nos cargos. Com isso, prevalece o acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE-PA), que cassou os diplomas da dupla por abuso de poder político e econômico e determinou a realização de eleições suplementares no município.

A decisão judicial teve como base uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) que revelou práticas consideradas abusivas durante o pleito de 2024. O TRE-PA constatou que a prefeitura de Cametá promoveu uma contratação excessiva de servidores temporários e de pessoas físicas por dispensa de licitação, sem respaldo legal ou justificativas plausíveis.

De acordo com os autos, em julho de 2023 o município tinha 997 servidores temporários. Já em julho de 2024, ano eleitoral, esse número saltou para 2.327 – um crescimento de mais de 130%. A folha de pessoal também disparou: de R$ 2,4 milhões, em julho de 2023, para R$ 5,7 milhões no mesmo mês de 2024.

Além disso, só em 2024 foram emitidas mais de 9 mil notas de empenho para a contratação direta de 1.037 pessoas físicas para funções corriqueiras, como serviços administrativos, limpeza e enfermagem. Essas despesas, feitas sem processo licitatório e sem respaldo em lei autorizativa, sequer aparecem na folha regular de pagamento, o que amplia o impacto econômico do caso.

Fundamentação da decisão

O ministro André Mendonça considerou incontroversos os fatos levantados pelo TRE-PA. Segundo ele, a defesa dos investigados não conseguiu apresentar provas de que as contratações tinham respaldo legal ou estavam ligadas a necessidades excepcionais da administração.

Mendonça destacou que:

O abuso de poder político ficou configurado pelo uso da máquina administrativa em benefício da candidatura à reeleição.

O abuso de poder econômico se materializou no impacto financeiro da expansão da folha de pagamento, muito superior ao limite legal de gastos de campanha.

O caráter qualitativo e quantitativo das contratações, realizadas em ano eleitoral, sem justificativa plausível, comprometeu a normalidade e a legitimidade do pleito.

O ministro também ressaltou que não cabe à Justiça Eleitoral rever individualmente a legalidade de cada contratação, mas sim avaliar o conjunto da prática e seus efeitos sobre a lisura da disputa. Nesse contexto, ficou comprovado que o volume das contratações ultrapassou qualquer parâmetro administrativo aceitável, assumindo feição eleitoreira.

Cassação e inelegibilidade

Com a decisão, ficam cassados definitivamente os mandatos do prefeito e do vice de Cametá. O prefeito Victor Corrêa Cassiano ainda foi declarado inelegível, por ser o único com poderes para autorizar as contratações irregulares. A Justiça Eleitoral do Pará deverá marcar novas eleições para o município, em cumprimento imediato ao acórdão.

Impacto político

A decisão de Mendonça reforça o entendimento do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de que o uso desmedido da máquina pública em ano eleitoral, sobretudo por meio de contratações ilegais, configura abuso de poder apto a comprometer a legitimidade das urnas. Para Cametá, significa a abertura de uma disputa suplementar que pode alterar profundamente a correlação de forças políticas locais.

Ao rejeitar todos os argumentos da defesa e revogar a liminar que mantinha os cassados no cargo, o ministro deu um recado claro: práticas administrativas que desviem recursos e estruturas do Estado para fins eleitorais não serão toleradas.

Em síntese, Cametá viverá um novo ciclo político, imposto pela Justiça Eleitoral, em nome da lisura e da normalidade democrática.

OS PRINCIPAIS TRECHOS DA DECISÃO

Sobre a gravidade das contratações

“É incontroverso que, em julho de 2023, havia 997 servidores temporários em Cametá. Em julho de 2024, esse número saltou para 2.327, o que corresponde a um aumento de mais de 130% de contratações em ano eleitoral. A folha de pessoal, no mesmo período, passou de R$ 2.433.645,35 para R$ 5.732.450,26. Além disso, em 2024, o Município emitiu mais de 9 mil notas de empenho para 1.037 pessoas físicas, contratadas de forma direta e sem respaldo legal.”

Sobre a falta de justificativas plausíveis

“Os investigados não juntaram lei que autorizasse as contratações, tampouco processos administrativos ou atos que fundamentassem a necessidade de excepcional interesse público. No caso das contratações por dispensa de licitação, também não apresentaram qualquer justificativa ou processo administrativo que as respaldasse.”

Sobre a caracterização do abuso

“A contratação excessiva e irregular de servidores temporários e pessoas físicas por dispensa de licitação, em ano eleitoral, sem demonstração de necessidade excepcional e em volume significativamente superior aos anos anteriores, configura abuso de poder político entrelaçado com abuso de poder econômico, o que enseja a cassação dos diplomas e a inelegibilidade do responsável.”

Sobre o impacto no pleito

“Não é necessário demonstrar que o resultado da eleição teria sido alterado. A lei afasta essa exigência. O que se analisa é a dimensão do impacto da conduta ilícita no ambiente eleitoral concreto. Nesse ponto, é inegável que a contratação de mais de três mil pessoas, sem respaldo legal e em pleno ano eleitoral, comprometeu de forma severa a normalidade e a legitimidade das eleições.”

Sobre a tentativa de defesa

“As manifestações dos investigados contêm meras afirmações genéricas de que as contratações teriam sido regulares. Os documentos juntados são apócrifos, sem timbres, assinaturas ou datas de publicação. O conjunto probatório é insuficiente para afastar as evidências de desvio de finalidade eleitoral.”

Sobre a responsabilidade do prefeito

“A sanção de inelegibilidade é aplicada ao prefeito, por ser o único com poderes para efetivar as contratações ilegais. Fica, portanto, caracterizada sua responsabilidade direta nos atos que macularam o pleito de 2024.”

Síntese da tese firmada

“As condutas analisadas demonstram desvio da função administrativa, em benefício da candidatura à reeleição. O abuso de poder, em suas modalidades político e econômico, comprometeu a igualdade de condições entre os candidatos e a própria legitimidade do processo eleitoral em Cametá.”

Victor Cassiano não é mais o prefeito de Cametá

Do Portal Ver-o-Fato