A Justiça Federal aceitou a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) e tornou réus nove pessoas, entre elas ex-secretários do governo do Pará, por fraudes na compra de 400 respiradores em 2020, durante a pandemia da Covid-19. A decisão, que juridicamente significa o recebimento da denúncia, foi proferida no último dia 28 de agosto pela 3ª Vara Federal Criminal em Belém e divulgada na quarta-feira (3).
O esquema investigado envolveu a aquisição dos equipamentos por R$ 50,4 milhões e, segundo o MPF, configurou crimes como fraude em licitação, superfaturamento, entrega de produto que não funcionava, falsidade ideológica, peculato, corrupção passiva e associação criminosa.
Entre os denunciados que agora são réus estão um ex-chefe da Casa Civil, um ex-titular da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (Sespa), além de um ex-secretário adjunto de Gestão Administrativa da Sespa, e outros servidores e empresários da empresa SKN do Brasil de importação e exportação de eletroeletrônicos.
A denúncia do MPF, apresentada em fevereiro de 2025, aponta que o processo de dispensa de licitação foi montado para direcionar a compra para a SKN do Brasil.
O g1 tenta contato com todos as defesas dos nove réus. O g1 também solicitou o posicionamento da Casa Civil, da Sespa e da empresa envolvida. Como os réus são são mais servidores, o Estado informou que não vai se manifestar. Já a empresa não respondeu até a última atualização desta reportagem.
As investigações revelaram uma série de irregularidades:
- pagamento antecipado e fraudulento: R$ 25,2 milhões foram pagos à SKN do Brasil (50% do valor total) sem qualquer garantia de entrega, contrariando a Lei de Licitações;
- montagem do processo: documentos foram produzidos com datas retroativas para dar uma aparência de legalidade a uma compra já acordada;
- empresa sem qualificação: segundo o MPF, a SKN do Brasil não tinha qualificação técnica, nem autorização da Anvisa para vender ventiladores pulmonares, e suas atividades registradas não incluíam equipamentos médico-hospitalares;
- superfaturamento: laudos da Polícia Federal indicaram preços 80% acima do valor de mercado. Além disso, o frete internacional de R$ 5,5 milhões, cobrado pela SKN, foi na verdade coberto por uma doação de uma empresa mineradora;
- produto que não servia: os respiradores entregues eram de modelo diferente do contratado e foram considerados inservíveis para pacientes com Covid-19, sendo mais adequados para uso pedagógico;
- desvio de recursos e corrupção: no mesmo dia do repasse à SKN, o representante da empresa transferiu R$ 1 milhão para uma empresa de fachada, supostamente para pagar vantagens indevidas a servidores públicos;
- dinheiro em espécie: quase R$ 1 milhão em dinheiro foi encontrado nas residências de investigados durante mandados de busca e apreensão em junho de 2020.
- ocultação de provas: o celular de Alberto Beltrame foi apreendido com dados anteriores a maio/junho de 2020 apagados, o que sugere ocultação de fatos.
O MPF pede à Justiça a condenação dos nove denunciados a penas de prisão, além de uma reparação de R$ 25,2 milhões por danos materiais e R$ 500 mil de cada um por danos morais coletivos, argumentando que os crimes abalaram a sociedade e feriram valores constitucionais.
A Justiça também retirou o sigilo do processo e autorizou o compartilhamento de provas com a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Receita Federal. Já o inquérito que investigava o governador Helder Barbalho por suposto envolvimento com o caso foi arquivado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em outubro de 2023, sob sigilo.
Do G1