Crise na fiscalização: TCU aponta falhas graves no controle de recursos do Ministério da Cultura

O Tribunal de Contas da União (TCU) voltou a lançar luz sobre problemas estruturais no controle e fiscalização de recursos públicos no Ministério da Cultura (MinC), revelando dificuldades significativas na análise de prestações de contas e na responsabilização por irregularidades, num montante que chega a bilhões de reais sem verificação adequada.

Segundo relatório técnico sigiloso do TCU, analisado por veículos de imprensa, o Ministério da Cultura acumula quase 30 mil projetos de fomento cultural sem prestação de contas analisada, envolvendo aproximadamente R$ 22 bilhões em recursos públicos cujo uso não foi verificado adequadamente. O documento aponta que a situação é antiga — já se arrasta por mais de 15 anos — e continua sem solução efetiva.

Esse “apagão” na fiscalização ocorre em programas de incentivo cultural que se relacionam com mecanismos como a Lei Rouanet, a Lei Aldir Blanc e a Lei Paulo Gustavo, entre outros instrumentos de fomento.

 

Falhas operacionais e controle precário

Auditores do TCU destacam que o MinC não possui mecanismos internos eficientes para acompanhar prazos legais ou para integrar os processos de fiscalização à tecnologia moderna, fazendo uso, inclusive, de planilhas manuais em Excel para controle de prazos e análises — um método que é considerado frágil e inadequado para a complexidade e o volume de recursos envolvidos.

Além disso, a Corte encontrou deficiências de capacitação técnica entre os servidores responsáveis, que, em reuniões com auditores, demonstraram desconhecimento sobre conceitos básicos de controle e prescrição de contas. Isso agrava a incapacidade de o ministério cumprir os prazos legais e realizar análises criteriosas de processos de prestação de contas.

Risco de prescrição e perda de valores

Um dos principais riscos apontados no relatório é a prescrição intercorrente — situação em que, por falta de análise dentro dos prazos legais, as dívidas deixam de poder ser cobradas ou os responsáveis deixam de ser responsabilizados. Estimativas preliminares indicam que aproximadamente 1,3 mil projetos já podem ter prescrito, com potenciais valores de até R$ 1,2 bilhão que dificilmente poderão ser recuperados.

Sem fiscalização efetiva, os responsáveis por irregularidades continuam habilitados a acessar novos financiamentos, o que, segundo o TCU, representa um risco grave à integridade do sistema de fomento cultural.

Repercussão política e institucional

O relatorio reforça críticas anteriores feitas pelo TCU sobre falta de transparência e fragilidades na gestão de recursos do Ministério da Cultura, que já haviam sido objeto de auditorias e decisões da Corte ao longo do ano. Em março de 2025, por exemplo, relatórios do TCU tornaram públicas irregularidades de gestão e apontaram dificuldades de fiscalização associadas à má organização interna, falta de definição de funções e a supostas ineficiências em programas culturais.

Respostas e críticas do Ministério da Cultura

Em nota, a ministra da Cultura Margareth Menezes reconheceu que existe um “desafio estrutural” na gestão e fiscalização das prestações de contas e disse que o ministério está adotando estratégias de otimização de processos internos e revisão de dados para corrigir falhas históricas herdadas de gestões anteriores. O ministério também afirmou que as cifras podem parecer maiores devido a mudanças metodológicas na forma como o estoque de prestações de contas pendentes é calculado.

No entanto, críticos — inclusive auditores ouvidos pelo TCU — afirmam que, apesar de promessas de solução e iniciativas de “forças-tarefa”, a atual administração ainda não apresentou resultados concretos e duradouros para reduzir o passivo de processos nem para implementar sistemas de controle mais robustos e tecnológicos.

O QUE ESTÁ EM JOGO

A falta de fiscalização efetiva implica mais que perdas financeiras: compromete a transparência no uso de verba pública, fragiliza programas culturais e pode criar um ambiente em que irregularidades não são devidamente investigadas ou punidas. Além disso, sem um processo de análise adequado, gestores e proponentes de projetos permanecem sem restrições para acessar futuros recursos — um ponto que preocupa especialistas em integridade pública e governança.

Do Jornal PASSAPORTE com agências e portais/Foto: Estadão.com