POVOS DO PARÁ SE UNEM PARA DENUNCIAR O USO DE AGROTÓXICOS E EXIGIR QUE NOVOS CAMINHOS SEJAM CONSTRUÍDOS PARA MANTER A VIDA DOS POVOS E A VIDA DA FLORESTA, E CONSTROEM CARTA POLÍTICA A SER LEVADA À COP 30
Nos dias 26, 27 e 28 de setembro aconteceu o evento “Jornada Somos a Floresta: Povos da Amazônia em Defesa da Justiça Social e Ambiental”, que iniciou no Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém com o Tribunal Popular contra os Agrotóxicos. O evento, além de debater a contaminação por agrotóxicos na região oeste do Pará, teve como objetivo levar o debate sobre a Cúpula dos Povos e COP 30 aos territórios de povos indígenas, comunidades quilombolas, agroextrativistas e agricultores familiares das regiões do Baixo Amazonas, Transamazônica e Nordeste paraense.
O Tribunal Popular contra os agrotóxicos foi uma mobilização social e democrática de cunho político e moral, que expôs empresas e toda a bancada que apoia o agronegócio. A população civil, movimentos e organizações sociais e parceiros de modo geral, se organizam para denunciar o uso desordenado dos agrotóxicos na região e buscar novos caminhos em favor da vida das populações e da floresta, pelo Bem Viver na Amazônia, respeitando os modos de vida tradicionais dos povos.
O principal motivo da realização deste tribunal se deu pelo índice alarmante e desenfreado do uso de agrotóxicos nas monoculturas de grãos e os danos que esse uso vem causando à população ao longo de mais de 20 anos. E atualmente, inclusive, comunidades inteiras desapareceram, e outras vem sendo sufocadas pelo crescimento da monocultura de grãos onde se utiliza de produtos químicos, pesticidas e venenos causando danos graves à saúde humana e ao bioma amazônico.
Na ocasião, comunidades trouxeram relatos de violências que estão sofrendo, mostrando esse projeto de morte que se espalha e assola a região de Santarém, e colocaram o agronegócio e os agrotóxicos nesse lugar do banco dos réus, que eles não ocupam na justiça comum. Dessa forma, no tribunal simbólico, o “Estado brasileiro foi considerado culpado por omissão deliberada e ação criminosa ao falhar em seu dever de regular e fiscalizar o uso de agrotóxicos, criando condições para violações sistemáticas de direito no planalto santareno”. Essa foi uma das acusações contra o uso dos agrotóxicos na região de Santarém.
A presidente da FOQS- Federação das Organizações Quilombolas de Santarém, nos fala sobre a importância do Tribunal Popular.
“Esse momento aqui do tribunal se torna muito importante, é uma forma da gente trazer a voz das comunidades quilombolas de Santarém para esse momento vivenciado, pois temos o uso do agrotóxico muito presente nas nossas vidas. Então assim, é o momento da gente também compartilhar, é o momento da gente trazer pros demais povos e também acredito que essa é a união dos povos aqui pra que a gente possa fazer esse enfrentamento do agrotóxico, pra que a gente possa fazer esse enfrentamento do agronegócio aqui na nossa região e em especial aqui no município de Santarém, uma vez que esse empreendimento está afetando diretamente não só a nossa vida, mas o nosso modo de vida, o nosso modo de viver, a nossa cultura e a nossa identidade”.
Os debates no Tribunal Popular fortalecem a luta e colocam os jovens à frente e inteirados da realidade territorial, unindo organizações e instituições como a universidade que contribuem com pesquisas. Durante o evento, Manoel Munduruku afirmou que a luta é difícil, mas pela realidade que a população vem sofrendo acerca da saúde, educação, políticas públicas e o território degradado, esse movimento é válido. “Nós precisamos sobreviver da nossa vida digna como era antes. Hoje a gente está vendo o que é que está acontecendo, hidrovia, rodovia, escavação, ferrogrão, construção de porto no lago Maicá, acabando com a nossa cultura própria. Só nós sabemos o tanto que a gente está sofrendo no nosso dia a dia com o racismo, o preconceito e a discriminação. Porque nós já temos sobrevivendo dificilmente porque nós não temos mais o nosso alimento saudável, o nosso alimento sem contaminação. Isso está acabando com a nossa população indígena, mas eu tenho certeza que esse movimento popular aqui pode dar sensibilidade pra gente e para ajudar o avanço dos nossos direitos. Eu creio muito, aposto muito na possibilidade também desses jovens que hoje estão dentro da universidade e que eles possam fortalecer toda essa conjuntura contra o preconceito que está acontecendo dentro do nosso território”.
Durante o evento, aconteceu também a feira agroecológica das mulheres das associações organizadas e que lutam pelos seus territórios, principalmente por soberania alimentar e comida produzida sem veneno.
O segundo dia de evento foi marcado por outro momento importante, onde os territórios presentes no evento se reuniram e colocaram em pauta suas demandas, e a partir dessa dinâmica os territórios de forma ativa e direta construíram uma carta política que traz de maneira firme a possibilidade de transformação climática e justiça ambiental que vem de soluções que partem dos territórios. A carta política é resultado da Jornada Somos a Floresta, e sua importância é a união de outras cartas e outros documentos que estão sendo preparados em outros territórios nesse processo que está sendo chamado de “Territorialização da Cúpula dos Povos”, e essa será a síntese em forma de uma grande carta da Cúpula dos Povos na COP30. Sara Pereira, coordenadora regional da Fase Amazônia, compartilha conosco sobre a importância desse momento.
“A cúpula não é só uma articulação da sociedade civil brasileira. É uma articulação da sociedade civil global. Nós temos diversos países, diversos continentes, movimentos sociais das mais diversas ordens, territórios, organizações. Então vai ser uma grande confluência, uma grande convergência de luta, de resistência, mas também de visibilidade de toda essa potência que é a articulação da sociedade civil, dos movimentos sociais, nesse grande processo de dizer que a solução vem dos territórios, a solução para a crise climática nunca sairá do mercado e é quem produz a crise, né? Essa crise é produzida pelo mercado, mas a solução nunca poderá vir de lá. Portanto os territórios têm as verdadeiras soluções, né? E que são soluções baseadas em processos econômicos diversos, e numa dinâmica horizontal, onde a geração de emprego e renda é realmente diversificada, a produção de alimentos sem veneno, com protagonismo das mulheres e da juventude, então essas economias elas já existem, elas tão nos territórios e é daí, só daí desses processos que pode vir realmente uma resposta que garanta efetivamente justiça climática para os territórios, para o mundo. A Cúpula dos Povos tem essa missão, essa missão de fortalecer esses processos que vem dos territórios”.
O evento encerrou com uma mística em forma de ciranda, o que representa a união de todos os povos do território amazônico em defesa da vida, em defesa de seus territórios, na luta por Justiça Climática e por soberania alimentar pelo Bem Viver de todos.
Texto: Sarah Santos de Jesus Pacini