Belém e Barcarena (PA) recebem, nos dias 5 e 6 de outubro, uma programação que marca os dez anos do naufrágio do navio Haidar, que deixou quase 5 mil bois mortos e despejou toneladas de óleo no rio Pará, em um dos maiores desastres socioambientais da região. A iniciativa, realizada pelo Ministério Público Federal (MPF), pela Promotoria de Justiça de Barcarena, pela organização não governamental Mercy For Animals e Comissão de Direito Animal da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Pará (OAB-PA), tem como objetivo chamar a atenção para os impactos do naufrágio e da exportação de animais vivos por via marítima como um todo, que concentra boa parte de suas operações no porto de Vila do Conde, em Barcarena.
No dia 5 de outubro, na Praça da República, em Belém, será realizada uma manifestação pacífica para lembrar o desastre e pedir pelo fim da exportação de animais vivos no país. Já no dia 6 de outubro, o auditório da Escola Técnica de Barcarena recebe o seminário “10 anos depois: o naufrágio do navio Haidar”, que contará com mesas de debate, a exibição do documentário “Elias: O Boi Que Aprendeu a Nadar” e espaço para a participação da população local. Serão discutidos os desdobramentos da tragédia, os prejuízos socioambientais ainda presentes na região e os caminhos possíveis para superar essa realidade.
“Experiências como a do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) celebrado no caso do navio Haidar mostram como o Ministério Público, com o apoio da sociedade civil, pode apoiar projetos locais, contribuindo para uma troca de conhecimento e promovendo reparações diretas às comunidades afetadas. O evento é importante para dar continuidade a essa troca, e não permitir o esquecimento da tragédia”, ressalta o procurador da República Bruno Araújo Soares Valente.
“O sistema de justiça enfrenta desafios em lidar com direitos coletivos e danos ambientais. Muitas vezes, as comunidades não se beneficiam das medidas mitigadoras. Reconhecer essas falhas é crucial para uma justiça ambiental que atenda às reais necessidades da população. Relembrar o caso do navio Haidar nos permite ver caminhos possíveis”, comenta o promotor de Justiça Márcio Maués, titular da 1ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, da Infância e Juventude de Barcarena.
DEZ ANOS DO NAUFRÁGIO
Em 6 de outubro de 2015, a cidade de Barcarena foi palco de uma tragédia de grande magnitude envolvendo a exportação de animais vivos. Na ocasião, o navio Haidar, com quase 5 mil bois vivos, 28 tripulantes a bordo e carregando 700 toneladas de óleo, naufragou no porto de Vila do Conde. A decomposição dos corpos dos animais mortos e o vazamento de óleo do navio provocaram um dos piores desastres ambientais da história do Pará. As carcaças e o óleo que vazou do Haidar deixaram um rastro de contaminação que alcançou a cidade de Belém, cerca de 60 km rio abaixo.
A tragédia comprometeu a subsistência de milhares de famílias da região e afetou a saúde de centenas de pessoas no decorrer dos anos, além de gerar enorme prejuízo para os cofres públicos. Após o incidente, foi realizado acordo judicial envolvendo MPF, MInistério Público do Estado do Pará (MPPA), as Defensorias Públicas da União (DPU) e Estadual (DPE-PA), o Estado do Pará e o Município de Barcarena, e as empresas responsáveis para pagamento de indenizações pelos danos individuais e coletivos causados. Segundo informações oficiais do MPF, foram pagos R$ 10.650.000,00 para as famílias impactadas e R$ 3.050.000,00 destinados ao financiamento de projetos comunitários locais, por meio da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), com gestão do valor pelo Fundo Dema.
Dez anos depois, a carcaça do navio Haidar permanece naufragada no berço de atracação 302 do porto de Vila do Conde, sendo responsável por um prejuízo inestimável à atividade portuária decorrente da não utilização dessa estrutura. De acordo com o Portal da Transparência, apenas com a contratação de empresa dos serviços de reflutuação e remoção do navio Haidar – serviço que nunca chegou a ser concluído – o governo federal já gastou mais de R$ 12 milhões dos mais de R$ 44 milhões licitados.
“Além de uma atividade intrinsecamente problemática do ponto de vista do bem-estar animal, o transporte de animais vivos por via marítima traz elevados riscos ambientais, sanitários, sociais e econômicos, como infelizmente vimos em Barcarena. Há dezenas de casos de acidentes e de contaminação mundo afora, pois os navios transportadores são antigos e apresentam problemas de segurança, com risco de naufrágio duas vezes maior que o de outras frotas mercantes”, afirma a responsável pelo Departamento Jurídico da Mercy For Animals na América Latina, Paula Cardoso.
A elevada propensão a acidentes é uma característica da frota que transporta animais vivos por mar ao redor do mundo. Segundo o jornal britânico The Guardian, estima-se que a chance de um navio que transporta animais vivos naufragar e causar um acidente ambiental ou marítimo é duas vezes maior do que a de outros navios mercantes, como já aconteceu anteriormente em diferentes locais do mundo. Isso se deve principalmente ao fato de que aproximadamente 80% da frota mundial de transporte de animais vivos, constituída de cerca de 150 embarcações, não foi construída para essa finalidade, além de serem embarcações muito antigas, usualmente.
Serviço:
Manifestação em memória do naufrágio do navio Haidar e pelo fim da exportação de animais vivos
Praça da República, Belém (PA)
05/10 às 9h
Seminário “10 anos depois: o naufrágio do navio Haidar”
Auditório da Escola Técnica de Barcarena – Barcarena (PA)
06/10 – 9h às 12h30
Imagem: MPF