A rodada de reuniões que deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) fará a partir desta quarta-feira em Washington D.C. com representantes do governo dos Estados Unidos servirá para que ele apresente aos auxiliares de Donald Trump um amplo dossiê sobre a repercussão política da aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A intenção do filho 03 de Jair Bolsonaro é demonstrar que, embora a retaliação não tenha impedido Moraes de decretar a prisão domiciliar de seu pai, a medida teve efeitos na Corte e no Congresso Nacional — e que o “sistema” estaria, na expressão usada por eles, “digerindo” a ofensiva de Trump.
Ao lado do ex-apresentador da Jovem Pan Paulo Figueiredo, com quem tem articulado sanções contra o Supremo e empresas brasileiras junto à administração Trump, Eduardo vai defender que a retaliação americana foi bem sucedida ao tensionar os bastidores da Corte e dar fôlego à oposição, que liderou na semana passada uma rebelião na Câmara dos Deputados e no Senado Federal pressionando pela inclusão da anistia bolsonarista na pauta do Legislativo, e por esse motivo precisa ser mantida pelos EUA.
Ele e Figueiredo também destacarão no relatório que Moraes não consultou nem o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e nem os colegas mais próximos no STF, como Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, ao determinar a prisão domiciliar de Bolsonaro, ao contrário do que fez em outras decisões. Na avaliação deles, que será exposta nas reuniões, Moraes não o fez porque sabia que não teria a aprovação dos principais aliados.
Ainda no âmbito do Supremo, o dossiê exibirá reportagens que apontam para um desconforto nos bastidores da Corte com a postura do relator do processo da trama golpista. Como mostramos no blog na última terça, Barroso e Gilmar aconselharam o colega a “maneirar” suas decisões, embora publicamente mantenham uma defesa incondicional das ações do magistrado.
A meta é reforçar ao governo dos EUA que a melhor estratégia é isolar Moraes dentro do Supremo antes de acionar a Lei Magnitsky contra outros ministros que já tiveram seus vistos cancelados por Washington. Ou, posto de outra forma, esperar que o “sistema” absorva e aceite que Trump não pretende recuar.
Na leitura de Eduardo e Figueiredo, a tendência é que Moraes vá ficando isolado no STF diante das sinalizações do governo Trump.
Barroso, cujo filho trabalhava na filial do BTG Pactual em Miami e é dono de um apartamento de luxo na cidade da Flórida, é hoje o ministro mais preocupado com a possibilidade de novas sanções amparadas pela legislação americana. Gilmar, por sua vez, buscou interlocução com aliados de Jair Bolsonaro antes da prisão domiciliar do ex-presidente e se reuniu com banqueiros ao lado do ministro Cristiano Zanin para sondar o alcance da Magnitsky sobre as finanças dos sancionados.
O relatório bolsonarista que será entregue à Casa Branca também busca convencer o governo americano de que as chances de aprovação da anistia no Congresso aumentaram desde as sanções contra Moraes, embora os presidentes da Câmara e do Senado ainda resistam à pauta bolsonarista.
Um acordo firmado pelo ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) com a oposição e fechado à revelia do atual dirigente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), prevê a votação do projeto que pode anistiar desde os envolvidos nos ataques do 8 de janeiro até Bolsonaro, além do fim do foro privilegiado para parlamentares.
Essa segunda proposta também será defendida junto ao governo dos EUA como necessária para “libertar” os parlamentares da “chantagem” do Supremo e aumentar as chances de aprovação da anistia.
O projeto é defendido pela oposição pois, ao prever autorização do Congresso para a abertura de inquéritos criminais e submetê-los à primeira instância, bolsonaristas acreditam que deputados e senadores se sentiriam mais à vontade para se posicionar contra o Supremo sem temer retaliações.
O apoio público de 41 senadores ao impeachment de Moraes – margem suficiente para instaurar o processo no Senado caso o pedido seja acatado pelo presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), mas ainda bem menor do que os dos 54 votos necessários para destituir o ministro – também será explorada por Eduardo como uma conquista.
Também serão anexadas ao dossiê pesquisas conduzidas pelo Instituto de Planejamento Estratégico (Ibespe), empresa paulista sem tradição no mercado de pesquisas cujos levantamentos têm sido impulsionados por lideranças bolsonaristas.
Os dados favorecem a narrativa da direita brasileira em diferentes frentes. Indicam, por exemplo, que a sanção contra Moraes via Magnitsky encontrou menos resistência na sociedade do que o esperado: 42,6% responderam que são favoráveis contra 43,5% contrários, o que refletiria uma sociedade dividida.
Outras pesquisas realizadas após o início da crise com Trump trazem resultados diferentes e bem menos interessantes para o bolsonarismo — como por exemplo a constatação de que 72% da população considera que o presidente dos EUA errou ao impor as tarifas de 50% sobre o Brasil, segundo a Quaest.
Os levantamentos, porém, não são 100% comparáveis porque também trazem perguntas diferentes e foram feitos em momentos distintos.
O Ibespe aponta Lula como o “maior culpado” pelo tarifaço de Trump (25,3%), contra 19,9% do próprio presidente americano e 11,5% de Jair Bolsonaro, dados que também soariam como música aos ouvidos de Trump. Eduardo, o principal artífice da ofensiva bolsonarista nos EUA, aparece com apenas 2,6% na projeção do Ibespe.
Eduardo também irá explorar os cenários da eleição presidencial sondados pela empresa. Na pesquisa estimulada, Bolsonaro, inelegível até 2030 após condenação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), aparece na liderança da corrida com 37,6% contra 28,4% de Lula.
Esse recorte será usado para alimentar a versão de que o ex-presidente é perseguido politicamente enquanto lidera as pesquisas de intenção de voto.
Em outro cenário, Eduardo aparece com 21,3%, empatado com Lula (22,4%) e à frente do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), com 19,6%. Conforme publicamos no blog, Tarcísio é alvo de uma fritura no governo Trump estimulada pelo filho 03 de Bolsonaro. Na Casa Branca, ele é visto como um “traidor” do ex-presidente pelas críticas públicas às tarifas americanas sobre os produtos brasileiros.
Nisso, também, as outras pesquisas trazem um cenário diferente. Segundo a Genial/Quaest divulgada no mês passado, Lula lidera todos os cenários de 1º turno, inclusive em um hipotético confronto com Bolsonaro. Eduardo também aparece bem atrás do atual presidente (15% contra 31%).
O relatório será apresentado dias após o cancelamento de uma reunião entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent. À exceção de um encontro entre o chanceler Mauro Vieira e o secretário de Estado americano, Marco Rubio, e de conversas bilaterais entre o vice-presidente Geraldo Alckmin e o secretário do Comércio, Howard Lutnick, o diálogo entre Brasília e Washington permanece interditado.
Nesse contexto intrincado nas relações entre os dois países, Eduardo Bolsonaro avança sem maiores dificuldades com a narrativa da direita sobre os meandros da administração Donald Trump.
Por Malu Gaspar/Notícia Max