Erveiras do Veropa mantém viva a cultura e as crenças do folclore amazônico. É fé e esperança!

Em 2023, o estudante Júlio Lobato, então com 18 anos, enfrentava um momento desafiador em sua vida: sair da casa dos pais e iniciar sozinho a própria jornada na fase adulta. “Me sentia carregado, cheio de energias ruins”, conta. Uma amiga o aconselhou a ir ao Ver-o-Peso para conhecer as erveiras e comprar um banho de descarrego.

“Esse banho me ajudou muito. Nossa! Foi minha primeira aproximação com banhos de ervas e, desde então, não parei mais. Comecei também a comprar as ervas para fazer os banhos em casa, principalmente de arruda, guiné e alecrim de Angola”, explica Júlio.

Atualmente, Júlio é cliente fiel da erveira Mirani Alexandre. Mulher de olhos atentos e mãos calejadas que, há 50 anos, se dedica ao ritual das plantas, essências e remédios naturais que vende todos os dias no mercado. Além dos banhos, Júlio explica que sempre leva os perfumes que atraem sorte em diversos âmbitos da vida e garante: eles realmente funcionam.

“Chora nos meus pés”, “chama dinheiro”, “fortuna” e “chama emprego” são os seus preferidos. “Quando eu uso a essência do ‘chama dinheiro’, os trabalhos na minha área de formação duplicam. Já quando uso o ‘chora nos meus pés’ percebo que chamo mais atenção na rua, as pessoas me olham de maneira diferente”, revela Lobato, que atualmente cursa faculdade de Análise e Desenvolvimento de Sistemas.

Ser erveira do Ver-o-Peso não é só uma profissão, é uma missão espiritual

Sentada em sua barraca, Mirani revela a sabedoria que atravessa gerações. Aos 57 anos de idade, ela não encara o ofício de erveira apenas como uma profissão, mas como missão espiritual. Todos os banhos, perfumes e remédios naturais são preparados por ela. Tudo passa pelas suas mãos antes de chegar às mãos dos clientes, em sua maioria ansiosos em solucionar problemas amorosos.

“As pessoas compram bastante o ‘Chora nos meus pés’ e o ‘Chega-te a mim’. Já em relação aos banhos, o de raiz do sol, que é de descarrego, e o atrativo, que chama coisas boas, são os mais procurados”, diz Mirani, bastante observadora.

Mirani aprendeu o ofício com a mãe, que também era erveira no Ver-o-Peso, e mantém viva a tradição ao lado dos filhos Kellen e Kleber, que trabalham com ela há vinte anos. “Nasci no meio das ervas. Isso não é só trabalho, é uma questão religiosa, espiritual, um dever de ajudar as pessoas e de repassar os conhecimentos de geração em geração. Ser erveira é manter viva a nossa ancestralidade”, diz Mirani.

Reforma do setor de ervas preserva tradição

No dia 17 de julho, o maior mercado a céu aberto da América Latina despertou ainda mais vibrante com a entrega dos setores de erva e hortifruti revitalizados pela Prefeitura de Belém. O espaço icônico é gerenciado por mulheres e homens, além de ser considerado um verdadeiro guardião das raízes culturais e religiosas da cidade, marcadas fortemente pela nossa ancestralidade indígena e africana.

“A reforma mudou tudo. Há anos que as barracas estavam velhas e quebradas. Agora está bonito, arrumado para os clientes verem, com barracas novas e de qualidade”, celebra a erveira, sem esconder o encantamento com o novo espaço.

Léia Santos tem 50 anos e é filha da lendária erveira dona Coló, outro nome forte da tradição. Trabalha no mercado desde nova e faz questão de manter o legado da família.

“Minha mãe parou de trabalhar no Ver-o-Peso devido à idade, mas ainda prepara as ervas em casa para trazermos diariamente e nos deixou muitos ensinamentos. Hoje, somos oito irmãos trabalhando como erveiros aqui. Eu já ensino o meu neto de seis anos o valor das ervas. Isso não é só sustento, é identidade. É manter viva uma cultura ancestral”, defende Léia.

Entre os muitos visitantes que se encantam com a tradição das erveiras, está Amanda Muniz, professora universitária de 34 anos, que veio de Juiz de Fora conhecer Belém pela primeira vez.

Na feira, se rendeu ao fascínio dos perfumes e vai levar vários para presentear os amigos. “Comprei para melhorar meus negócios. No interior de Minas Gerais, onde cresci, havia uma forte cultura de benzedeiras, mas isso está se perdendo. Ver que aqui em Belém essa tradição continua viva é maravilhoso”, diz Amanda, que levou para si o “chama dinheiro”.

Da Agência Belém