Minissérie dramatiza vida da australiana que ganhou fama vendendo falsos “tratamentos naturais” para o câncer
Lançada em 6 de fevereiro pela plataforma de streaming Netflix, a série “Vinagre de Maçã” traz uma história baseada em fatos reais – ou melhor, nas mentiras inventadas pela australiana Belle Gibson, que fez sucesso no início dos anos 2010 ao propagandear diversos “métodos naturais” que haviam, supostamente, curado seu câncer terminal.
Os seis episódios são uma versão roteirizada do livro The Woman Who Fooled The World (em tradução livre, “A mulher que enganou o mundo”, ainda sem edição brasileira), lançado em 2017 pelos jornalistas Beau Donelly e Nick Toscano, que desmascararam a rede de mentiras de Gibson.
A partir da descoberta de que a blogueira não fazia doações para a caridade como prometia, eles colocaram em xeque a rede de informações divulgadas sobre a doença e o tratamento de Belle Gibson.
A verdade, então, veio à tona: a australiana jamais havia sido diagnosticada com um tumor cerebral, e as histórias sobre “remédios naturais” não passavam de pseudociência.
Quais as mentiras de Belle Gibson?
A história começou em 2010, quando Gibson, grávida, compartilhou seu diagnóstico de um tumor maligno no cérebro em um fórum para futuras mães. Segundo ela, a previsão dada pelos médicos era de que ela tivesse de seis semanas a quatro meses de vida.
A partir de então, começou a compartilhar seu cotidiano nas redes sociais: ela defendia que, com uma mistura de suplementação de vitaminas, receitas ayurvédicas, oxigenoterapia, supositórios, terapia craniossacral e outras técnicas, tinha conseguido curar o câncer cerebral.
Gibson chegou a conquistar 200 mil seguidores no Instagram, um número expressivo em um período em que a plataforma ainda começava a se popularizar.
Outro pilar do “tratamento” propagandeado pela influenciadora australiana eram os alimentos orgânicos e sem glúten, assim como os sucos, cujas receitas eram compartilhadas no seu perfil. Ela foi além das redes sociais e, em 2013, lançou um livro de receitas – intitulado The Whole Pantry, ou “A despensa integral”, pela editora Penguin – e um aplicativo, de mesmo nome.
No livro, Gibson relatava que tinha chegado a fazer dois meses de quimioterapia e radioterapia, mas que a cura do câncer ocorreu quando deixou de lado a medicina tradicional e recorreu a esse combo de “remédios naturais”.
A desconfiança sobre a condição de Belle Gibson surgiu com a publicação de reportagens no jornal The Age. Os repórteres Beau Donelly e Nick Toscano foram contatados por amigos de Gibson, que relataram suas suspeitas sobre a doença e o tratamento da blogueira.
Como não tinham provas suficientes para demonstrar que o diagnóstico era falso, os jornalistas seguiram por outro caminho, apresentando evidências de que Gibson nunca havia encaminhado os valores angariados com o aplicativo para projetos beneficentes, como tinha prometido.
A série de matérias abriu caminho para a descoberta de outras mentiras da influenciadora.
Ela mentia sobre a própria idade e já tinha contado outras histórias falsas sobre doenças em fóruns na internet. O mais grave, claro, é que a blogueira nunca tinha sido um exemplo de “cura a partir de remédios naturais”, já que sequer tinha sido diagnosticada com câncer.
O livro foi retirado de circulação e, em 2017, Belle Gibson foi condenada pelo Tribunal Federal da Austrália a pagar uma multa de mais de 400 mil dólares australianos por conduta enganosa, fraudulenta e antiética.
Ela não está mais presente nas redes sociais e, até hoje, não pagou a dívida com o Estado da Austrália.
Por que “Vinagre de Maçã”?
Embora seja baseada em fatos reais, a série dramatiza a vida de Belle Gibson. Ou seja, nem todos os elementos exibido na tela são reais.
De acordo com a Netflix, o propósito da produção é mostrar os perigos da indústria do wellness e das promessas milagrosas de curas e bem-estar presentes em receitas divulgadas nas redes sociais.
O vinagre de maçã é um exemplo disso: diversos influenciadores estimulam seguidores a usar o ingrediente como remédio para melhorar a saúde, chegando a sugerir que se beba um copo do líquido pela manhã – o que não traz qualquer benefício comprovado pela ciência e pode ainda comprometer a saúde gastrointestinal.
E ele é apenas um dos tratamentos milagrosos compartilhados à exaustão nas redes sociais. A série leva esse tipo de moda às últimas consequências para mostrar os riscos de se acreditar em informações sem respaldo científico. A personagem Milla, retratada nos seis episódios, que não existe na vida real, mas é baseada em Jess Ainscough, narra exatamente esse perigo.
Contemporânea de Gibson, Jess era uma editora de revista que sofria de câncer, e largou os tratamentos convencionais para apostar nas promessas naturais. Ela também compartilhava sua rotina com esses remédios, e morreu aos 29 anos por conta da doença.
A mãe de Jess desenvolveu câncer e, ao tentar seguir as dicas da filha, acabou falecendo.
Fonte Saúde.Abril
Por Valentina Bressan
(Netflix/Divulgação)